segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Anestesista versus Cirurgião


Na semana passada, dia 16 de outubro, comemorou-se o dia do anestesista. Foi neste dia que Morton em 1846 aplicou a primeira anestesia geral a base de éter. É dessa figura enigmática e da sua estreita relação com o inseparável cirurgião que eu gostaria de divagar.
A cirurgia só pode verdadeiramente se desenvolver a medida que as novas técnicas anestésicas e drogas foram inventadas a partir de meados do século 19. Desde então a dependência do cirurgião pelo anestesista aumentou paulatinamente, de modo que muitos não fazem nenhum procedimento sem seu escudeiro fiel. Contudo, quando se trata principalmente do serviço público essa relação de dependência muitas vezes se torna bastante acirrada. Todas as situações que já havia vivenciado no Brasil, repetiram-se aqui na África, provando que não é um problema cultural, mas laboral.
A dependência do cirurgião mexe com muitas áreas que geram conflito. A maior delas, o ego. O do cirurgião é maior, claro, mas na busca de impor o seu, o anestesista, as vezes, extrapola suas razões, e a briga se inicia.  No final quem sempre sai perdendo é o paciente.
O apetite cirúrgico muitas vezes é o pé de Aquiles do cirurgião e é nele que sempre o anestesista vai atacar. Quando o cirurgião comete um pequeno deslize, por exemplo, esquece de pedir um determinado exame, pronto, cirurgia cancelada, menos um paciente.
No Brasil, existe a lenda de que em congresso de Anestesiologia, a conferência mais esperada é a cujo tema aborde: “como cancelar ou suspender uma cirurgia”.
Aqui na África, eu dou mil razões para os meus caros colegas não quererem trabalhar. Primeiro, eles são técnicos que fazem trabalho de médico, em infra-estrutura limitada, ganhando como técnico. Mas como o meu apetite cirúrgico muitas vezes é grande, muitas discussões já foram geradas. Outras vezes, eu preferi engolir a seco a raiva e vim me lamentar com o travesseiro.
No final eu fico pensando as razões do “boom” das cirurgias ambulatoriais (hospital-dia). Será que é para poder liberar o doente no mesmo dia? A verdade é que essa foi a maneira mais eficaz do cirurgião ficar finalmente livre do anestesista e fazer suas “loucuras” em paz. Voltar ao simples, ao passado em que ele tinha que anestesiar e operar ao mesmo tempo.
Aqui na África existem muitos hospitais em que ainda não temos anestesistas em que o cirurgião faz a raque e depois a cesareana. Graças a Deus eu não tenho essa necessidade, mas será ela de todo ruim?
Infelizmente sim, e o anestesista sabe disso, e por mais modismos que existem, o cirurgião vai sempre depender do anestesista que sempre vai ter o trunfo da palavra final e essa briga nunca terá fim, a não ser que a gente desça o pedestal e diga: “viva o anestesista, parabéns pelo seu dia!”

Um comentário:

  1. Eita, Dú!... O que dizer da relação médico-enfermeiro? Rsrsrs... Apesar das discussões e possíveis desentendimentos, uma coisa é certa: 'dependemos uns dos outros'. É bom e produtivo trabalhar em equipe! Espero que quando vc voltar o Brasil, Deus possa te conceder seu 'personal fiel escudeiro'!

    Um abração e saudades!

    Ana Paula

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